O novo Código de Processo Civil [1] passou a vigorar em 16 de março de 2016, em substituição ao código de 1973, e, dentre as novidades trazidas pela lei, teve a inédita regulamentação processual da desconsideração da personalidade jurídica.
O referido instituto tem aplicação no Direito Civil nos casos de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade da empresa e pela confusão patrimonial (art. 50 do Código Civil), e no Direito do Consumidor nas hipóteses em que houver prejuízo para o consumidor em razão de abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social, falência ou estado de insolvência e encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração (art. 28 do Código de Defesa do Consumidor).
É importante esclarecer, inicialmente, o conceito de pessoas jurídicas:
“Pessoas jurídicas, portanto, são entidades a que a lei empresta personalidade, isto é, são seres que atuam na vida jurídica, com personalidade diversa da dos indivíduos que os compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil.” [2]
Não há dúvida, portanto, que as pessoas jurídicas são diferentes das pessoas físicas que as constituem, e que a desconsideração da personalidade jurídica é a forma de se desprezar a separação entre a empresa e o sócio para atingir o patrimônio pessoal deste, nas hipóteses previstas em lei.
Até então, o instituto, que não tinha regulamentação processual, era admitido como medida excepcional com exercício diferido do contraditório (entendimento do Superior Tribunal de Justiça, exemplificado pelo AgRg no Ag 1332336 / SP Agravo Regimental no Agravo De Instrumento 2010/0124784-4), mas o NCPC inovou ao regular a desconsideração da personalidade jurídica, incluindo-o como incidente processual junto às modalidades de intervenção de terceiros, no Título III, especificamente nos arts. 133 e 137 do diploma.
No novo procedimento, o incidente pode ser suscitado pela parte ou pelo Ministério Púbico, em “todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial”, conforme previsão do art. 134. Além disso, torna-se possível para o sócio se defender antes mesmo de ter seus bens atingidos, nos termos do art. 135: “Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.”
A nova lei é elogiável neste ponto, por permitir o exercício do contraditório, inclusive com a produção de provas (art. 136), antes de ser atingido o patrimônio do sócio.
Por outro lado, as novas regras podem acabar tornando mais graves os prejuízos da desconsideração da personalidade jurídica para os empresários. É que, podendo ser instaurado a qualquer momento do processo, inclusive na petição inicial, quando o sócio é citado desde logo, e não por meio de incidente propriamente dito, ele será incluído no processo desde o seu início, e não, como ocorre atualmente, após o julgamento, o que certamente implica em restrições ao exercício da atividade empresarial. Neste sentido:
“A consequência é que em seu nome constará uma restrição que, por certo, poderá ser fator impeditivo para realização de novos negócios, a exemplo da compra e venda de imóveis, da captação de valores em bancos, entre outras negociações que exijam uma certidão negativa dos distribuidores cíveis, trabalhistas e fiscais.” [3]
O Processo Civil brasileiro, portanto, agracia os empresários ao lhes assegurar maior oportunidade de defesa, mas, ao mesmo tempo, pode implicar em limitação do exercício de sua atividade antes mesmo da efetivação da desconsideração da personalidade jurídica.
MELISSA DE CARVALHO SANTANA
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[1] BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015.
[2] RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Parte geral. 32 Ed. São Paulo: Saraiva: 2002. p. 86.
[3] EBAID, Karen. A desconsideração da personalidade jurídica e o novo Código de Processo Civil: O que pode mudar para o empresário? Migalhas. Disponível em < http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI231110,41046-A+desconsideracao+da+personalidade+juridica+e+o+novo+Codigo+de > 15/12/2015, 13h41