A possibilidade de alteração de regime de bens escolhidos quando da celebração do casamento é recente, tendo sido viabilizada pelo Código Civil de 2002. Antes do advento deste, era impossível realizar a alteração do regime de bens escolhido à época do casamento, uma vez que o artigo 230 do Código Civil de 1916 determinava que “o regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento, e é irrevogável”.
A alteração trazida pelo Código Civil de 2002 é de suma importância quando levamos em consideração o desenvolvimento sociocultural da sociedade e como o casamento é encarado nos dias atuais. Anteriormente, não era comum se estabelecer um projeto de vida patrimonial pelo casal, haja vista que normalmente ficava a cargo do marido estabelecer as diretrizes financeiras e patrimoniais do núcleo familiar.
A escolha do regime de bens no casamento é ponto importante, posto que produz inúmeros e complexos efeitos, uma vez que, fixado pela lei ou mesmo escolhido pelas partes, regerá as relações patrimoniais entre o marido e a mulher enquanto perdurar o casamento.
Diante disso, verifica-se a importância da alteração trazida pelo Código Civil de 2002 quanto a possibilidade de modificação de um regime de bens para outro, permitindo dessa forma que o casal possa exercer um planejamento financeiro e patrimonial que se adeque a realidade da vida em comum.
A alteração do regime de bens foi tratada no Art. 1.639, § 2º do Código Civil de 2002, que dispõe que é possível a modificação mediante autorização judicial, necessitando que haja o ingresso em juízo por meio de ação judicial em consenso entre os cônjuges, destacando-se que não pode ser realizado perante o cartório extrajudicial.
Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.
§ 1o O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento.
§ 2o É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
Diante da inovação trazida pelo Art. 1.639 do Código Civil de 2002, essa permissão gerou controvérsia na doutrina e jurisprudência quanto a possibilidade de se aplicar a norma aos casamentos celebrados anteriormente a inovação do Código Civil de 2002, sendo sanada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Em relação ao tema, o Superior Tribunal de Justiça tem firme orientação no sentido de aplicar o Artigo 1.639, §2°, do Código Civil de 2002, também aos matrimônios celebrados na vigência do Código Civil anterior, autorizando assim também a mudança do regime de bens aos casamentos anteriores, desde que cumpridas todas as exigências legais e respeitados os direitos de terceiros.
O Enunciado nº 113 da I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal trata acerca da possibilidade da alteração do regime.
“É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando então o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de vívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade”.
Assim, verifica-se que o pedido de alteração de regime dos bens deve ser motivado e instruído com certidões negativas e declaração de bens dos interessados, a fim de comprovar a possibilidade da modificação sem que atinja o patrimônio de terceiros.
Há que se salientar um outro ponto importante quanto a possibilidade de alteração do regime de bens. As recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça e os demais Tribunais estaduais estão caminhando no sentido de que para que haja a modificação não é necessária justicativas extraordinárias ou que estas estejam pautadas em razões profundas, bastando uma justificativa válida em relação ao desejo do casal de estabelecer um planejamento patrimonial familiar.
Nesse sentido, o Código de Processo Civil de 2015 trouxe em seu Art. 734 e parágrafos as previsões específicas para a propositura da ação judicial de alteração de regime de bens, prevendo que, tratando-se de jurisdição voluntária, é necessário o consenso entre os cônjuges para a propositura da ação, que deverá ser devidamente fundamentada nas razões pelas quais o casal deseja a modificação de regime.
Ressalta-se que, nos termos do artigo 734, § 3º do Novo CPC, a eficácia da sentença da alteração do regime de bens perante terceiros depende da averbação nos Cartórios de Registro Civil e de Imóveis e, no caso em que qualquer dos cônjuges seja empresário, junto ao Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins.
Há que se salientar, ainda, que embora a doutrina faça referência ao casamento, nada obsta que regras semelhantes sejam aplicadas à união estável, conforme previsão do Art. 1.725 do Código Civil, já que segundo entendimento do Superior Tribunal Federal há equiparação entre o casamento e a união estável.
Desta feita, diante de todas as modificações socioculturais vividas nos últimas décadas por nossa sociedade, percebe-se que a legislação vem ao encontro das modificações sociais para prever a possibilidade de alteração e adequação do regime patrimonial a ser estabelecido pelos casais, reconhencendo, assim, a ampla liberdade de escolha e da vontade do casal em adequar o matrimônio a uma nova realidade de interesse patrimonial do casal.[u1]
Por fim, caso haja o desejo por parte dos cônjuges de alterarem o regime de bens do casamento pré-estabelecido, se faz necessária a consulta a um advogado, já que a tramitação deste processo será dará somente por via judicial, não sendo permita, sua alteração via cartório extrajudicial.
Camila Stofeles Cecon Santana
Advogada
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1) DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4ª ed. Ver., atual. e ampl.3 tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2007, pg. 215.
2) https://jus.com.br/artigos/72258/os-efeitos-da-alteracao-do-regime-de-bens.